O
cadáver da barata ornava o primeiro degrau da escadaria. Brilhava, âmbar, sob a
luz do Sol. Lindo e inerte, recolhido a um canto, fora do alcance da sola de
qualquer sapato. Parou a admirá-lo, o cadáver. E assim ficou por tempo
indefinido, a se perguntar por que não estava, aquele cadáver de barata, com as
patas e a barriga para cima, como jazem todos os cadáveres de barata. Não. Ostentava,
aquele, suas belas e brilhantes asas.
E
delas, as asas, irradiavam-se furta-cores raios que lhe despertavam os sentidos
e os mais diversos pensamentos. E teve, por alguns momentos, durante aquele
tempo indefinido, a sensação de que ela, a barata, se movia. Tão languidamente,
quanto os raios refratados numa autoestrada banhada por um sol de um meio-dia
incandescente.
Piscou
algumas vezes a fim de se livrar de tal miragem. E a barata voltou a ser
cadáver.
Subiu,
então, a escadaria interminável. E ao último degrau só lhe restou, desperto e
entediado, ralhar com a empregada, o seu desleixo com a vassoura.