Sou uma pessoa de poucas palavras e muitas entrelinhas..

domingo, 14 de abril de 2013

O Cadáver




O cadáver da barata ornava o primeiro degrau da escadaria. Brilhava, âmbar, sob a luz do Sol. Lindo e inerte, recolhido a um canto, fora do alcance da sola de qualquer sapato. Parou a admirá-lo, o cadáver. E assim ficou por tempo indefinido, a se perguntar por que não estava, aquele cadáver de barata, com as patas e a barriga para cima, como jazem todos os cadáveres de barata. Não. Ostentava, aquele, suas belas e brilhantes asas.
E delas, as asas, irradiavam-se furta-cores raios que lhe despertavam os sentidos e os mais diversos pensamentos. E teve, por alguns momentos, durante aquele tempo indefinido, a sensação de que ela, a barata, se movia. Tão languidamente, quanto os raios refratados numa autoestrada banhada por um sol de um meio-dia incandescente.
Piscou algumas vezes a fim de se livrar de tal miragem. E a barata voltou a ser cadáver.
Subiu, então, a escadaria interminável. E ao último degrau só lhe restou, desperto e entediado, ralhar com a empregada, o seu desleixo com a vassoura.